domingo, 27 de março de 2016

Tavapensandoaqui que vi um velhinho

Tavapensandoaqui que vi um velhinho. O correto seria chamá-lo de um homem na melhor idade, mas vou ignorar essa chatice de politicamente correto. Ele vinha caminhando lentamente pelo outro lado da rua, com seu corpo um pouco curvado pelo peso das responsabilidades que a vida deve ter lhe impingido. Penso que a moçada de hoje já anda curvada pelo peso do celular que não sai da mão deles. Como será que eles vão chegar à idade do velhinho que acabei de ver? Eu estava na esquina da padaria perto de casa onde aguardava a condução. O velhinho trazia embaixo do braço uma sacola para colocar suas compras, imagino eu. Tinha poucos cabelos. Todos branquinhos. A pele estava enrugada e desgastada pelo tempo. Provavelmente nunca usou e nem pensou em usar qualquer tipo de creme para melhorar sua aparência e muito menos essa frescura de protetor solar para andar simplesmente pela rua. No tempo dele eu imagino que usar o creme de barbear era o máximo que era permitido. E aquele pós-barba que ardia que só. Ele trazia no rosto óculos de grau daqueles antigos. Era manhã, não fazia muito calor. O velhinho vestia o traje típico dos velhinhos, calça social larga na cor clara presa pelo cinto preto, camisa social branca de mangas curtas por dentro da calça e sandálias de couro com os dedos dos pés com suas unhas amareladas à mostra. Atravessou a rua com dificuldade pela faixa de pedestre e apresentou dificuldade para subir os pés na calçada. Mas subiu. Confesso que atravessar neste trecho onde fica a padaria aqui perto de casa não é fácil nem para os novinhos. A rua é toda cheia de buracos e remendos de asfalto, o trafego é irregular com os veículos que vem por aqui querendo ir para lá e os que vêm de lá querendo cruzar por aqui, os dali querem entrar logo acolá. E tem os que querem estacionar na padaria, vindos do lado de lá e querendo vir para cá, esperando o que está aqui sair e ir prá lá. Viu como é confuso? Eu disse que era. Ele subiu lentamente o pequeno aclive que separa a padaria da calçada. Entrou. Vi uma velhinha. Vinha pela mesma calçada da padaria. Caminhava lentamente tentando manter-se equilibrada nas irregularidades da calçada. Sim, a calçada é tão ruim quanto a rua. Usava um vestido estampado daqueles típicos de velhinha. Usava óculos e tinha os cabelos branquinhos. Trazia no braço uma sacola com algumas compras dentro. Usava aquelas sapatilhas de velhinha iguais a que uma amiga na época que jogávamos vôlei costumava usar para dirigir o carro até a quadra. Sempre brincávamos que ela deixava a vovó descalça quando vinha jogar. A velhinha aqui da história tinha o corpo pouco curvado e foi passando lentamente em frente a padaria. Parou, virou-se e subiu o pequeno aclive. Parou à porta. Não entrou. Nada da minha condução chegar. Um folgado estaciona o carro em frente ao ponto em que espero a condução. Desce e vai à padaria. Sem comentários. Desejei que ele quebrasse uma perna. Credo, eu não posso pensar assim. Arrependi-me. Desejei então que ele quebrasse as duas pernas. Olhei para a porta da padaria e vi o velhinho pagando a conta. Em dinheiro. Colocou o troco no bolso da calça. Uma moeda escapou-lhe das mãos. Ele deu de ombros, nem se importou. Saiu com a sacola cheia, cheirinho de pão fresco, caminhado lentamente. Olhou para o lado. Foi em direção à velhinha. Ele mais alto que ela encontrou-a e abaixou-se para dar-lhe uma bicota, um selinho. Deram-se as mãos saindo na direção da calçada. Cruzaram a rua pela faixa de pedestres, fazendo os carros pararem ou diminuírem a velocidade deixando o transito um pouco pior. Tudo devagarzinho, tudo lentamente, tudo com cuidado e sem stress. E nada da minha condução chegar. Vou atrasar. Maldito dia do rodízio. Que calor. Que mochila pesada. Que saco. Estou começando a suar. Sapato incomoda. Essa minha condução que não chega. Pensei em entrar na padaria e tomar um café rapidinho. Mas vai que a condução passe? Será que consigo atingir a idade do velhinho? Tava pensando aqui...

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